Conheci no fim de semana passado a pequena cidade de Pirenópolis, em Goiás, a menos de 150 quilômetros de Brasília. Lugarzinho muito legal. Povoado interiorano tradicional, Pirenópolis tem algo a ver com as cidades de colonização portuguesa do litoral catarinense. A Festa do Divino e as Cavalhadas são lá as principais festas populares, comemoradas com pompa, e a figura da cabeça de boi com os cornos floridos, emblema da Cavalhada, é onipresente. Mas não era época de nenhuma dessas festas e as atrações que conheci são outras. Ao mesmo tempo em que tem um povo muito católico e conservador, Pirenópolis atraiu há algumas décadas muitas comunidades de hippies, que se instalaram em sítios da região. Com a descoberta do turismo, nos anos 1980, e a recuperação do casario histórico colonial - a cidade já foi o centro de uma rica região de produção de ouro - outros imigrantes se misturaram aos antigos hippies e o povoado se transformou numa mistura de antigo e moderno. A rua do lazer, onde se concentram os bares e restaurantes, tem um pouco de tudo, em lugares pequenos, mas bonitos e aconchegantes. E os sítios em volta viraram destinos de ecoturismo muito procurados.
Duas atrações em particular me impressionaram bem. Uma delas é a igreja matriz. Construída no século 18, no auge do ciclo do ouro, foi restaurada em 1996 e quase completamente destruída por um incêndio em 2001. Por sorte, o então governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), é da cidade, o que certamente ajudou a captar recursos de grandes empresas e do próprio estado para uma nova restauração. A igreja foi completamente reconstruída e hoje abriga também um pequeno museu contanto como foi esse processo. Os técnicos tiveram que aprender a construír com adobe (técnica utilizada no século 18) para refazer a igreja como era antes. É impressionante a capacidade de isolamento térmico do adobe (argamassa a base de argila). Com um calor de quase 30 graus do lado de fora, a sensação dentro da nave principal da igreja é de que se está num ambiente com ar condicionado.
A outra atração é a Fazenda Vagafogo (o mesmo que vagalume, no linguajar local). O dono, Evandro, é um mineiro formado em Direito que nos anos 1960 foi hippie e foi morar numa comunidade alternativa na Bélgica, onde conheceu a atual mulher, também brasileira. Viajou por vários países e retornou ao Brasil nos anos 1980. Os dois conheceram Perinópolis (já um destino procurado por hippies), compraram uma fazenda e viraram pequenos agricultores, vendendo a produção em Brasília. Lá conheceram uma ONG, a Funatura, que os ajudou a transformar a fazenda em destino ecoturístico, há 15 anos, quando já tinham um filho adulto. Captaram recursos do governo britânico e da ONG WWF para construir um centro de visitantes. Metade da fazenda é de mata nativa e a outra metade produz frutas e gado. Arrumaram as trilhas e atraíram empresas que oferecem rapel, arvorismo e coisas do tipo. Mas a maior atração são os doces produzidos pela própria família com frutas do cerrado. Eles oferecem um brunch com a produção local que é barato e delicioso. E conseguiram tornar o negócio auto-sustentável. Além de tudo, são gente muito boa.
2 comentários:
Nunca vai faltar dinheiro para ONGs que vivem de defender o mundo das pragas do capitalismo, dos malvados capitalistas, armados de seus conhecimentos técnicos e científicos. Ainda mais no planalto central que, como você disse, é lugar de misticismos e abrigo de ripongas dos século XXI.
Se entendi bem o que você quis dizer PH, acho que há um pouco de injustiça no seu comentário. É preciso separar o joio do trigo. Embora existam muitos ambientalistas que buscam manter o ambiente natural intocado a qualquer custo, as ONGs mais bem sucedidas são as que buscam conciliar equilíbrio ambiental com desenvolvimento econômico. Não é exatamente um projeto anticapitalista. É antes uma forma de conciliar o capitalismo ou qualquer outro sistema baseado na produção de bens e serviços com a manutenção de bens naturais necessários, em última instância, à própria vida humana. Quando um ex-hippie se torna um empresário de turismo, não vejo aí uma iniciativa anticapitalista.
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