domingo, 11 de janeiro de 2009

PC

Atitudes e discursos "politicamente corretos" me incomodam um pouco. As aspas também são por conta desse incômodo. Uso a expressão consagrada na falta de uma melhor, mas não concordo lá muito com ela. O politicamente correto se coloca como um elemento da democracia, ao se dispor a ser porta-voz de minorias que não conseguem se fazem ouvir. Mas sempre me soa como algo autoritário, por rejeitar de antemão qualquer verdade que nao seja a sua.

A política é um cabo-de-guerra em que um grupo tenta puxar o poder para si, seja convencendo a opinião pública (em sistemas democráticos) ou pela força (quando em geral degenera para conflitos armados). Assim, algo só pode ser "politicamente correto" quando encarado do ponto de vista de um grupo. De outro ponto de vista (e não necessariamente o do adversário) pode não ser tão correto assim.

Mas o problema não está em defender um ponto de vista, o que é saudavelmente democrático. Parte do problema é o discurso de guerrilha: tudo o que o outro diz é mentira; tudo o que eu digo é verdade e, se você não concorda comigo, ou é ingênuo, ou está a serviço do outro.

Tentando explicar melhor, o que me incomoda não é nem o discurso politicamente correto. É a moda que diz que você precisa agir e falar em conformidade com esse discurso. Para ser inteligente, é preciso ser contra a morte de animais, em qualquer hipótese (o que não implica em ser contra a morte de seres humanos, em qualquer hipótese). É preciso ser absolutamente a favor dos palestinos e absolutamente contra Israel. É preciso ser antiamericano. É preciso ser a favor do sistema de cotas. É preciso ser contra as privatizações. É preciso usar esta ou aquela palavra, para não ser preconceituoso. É preciso ser contra o FMI (essa perdeu a graça, agora que o Brasil não depende mais do fundo) e contra o Banco Mundial. É preciso abolir as sacolas plásticas.

Não há problema em adotar nenhuma dessas posições, que fique claro. Mas elas deveriam ser resultado de alguma reflexão, e não um pressuposto. Parece ser o que ocorre, muitas vezes: quem discorda é por definição um reacionário ou um desinformado que não merece ser ouvido. E a certeza é nociva à razão. É a dúvida que nos fazer entender e aprender.

Um dia, na universidade, um grupo de ativistas do movimento estudantil interrompeu uma aula para nos convidar a uma assembleia: "vamos lá tirar uma posição contra a reforma universitária, porque isso nos afeta". Se é para tirar uma posição "contra", então ela já está tomada. O que eu vou fazer lá? Esse tipo de coisa me incomoda.

Um comentário:

Maurício Oliveira disse...

Falou e disse, Carlito. O problema é o maniqueísmo crônico: achar que é preciso ter opinião firme sobre tudo e que qualquer visão um pouco diferente é necessariamente oposta, como se não houvesse uma infinidade de tons de cinza entre o preto e o branco. A propósito, esse mal atinge em cheio a nossa categoria, né não?